TÓPICO ESPECIAL: INTERPRETANDO PARÁBOLAS
Os Evangelhos foram escritos muitos anos depois da vida de Jesus. Os
escritores do Evangelho (pela ajuda do Espírito) estavam
culturalmente acostumados com a tradição oral. Os rabinos ensinavam
por meio de apresentações orais. Jesus imitou essa abordagem oral
para ensinar. Para nosso conhecimento Ele nunca escreveu nenhum de
Seus ensinos ou sermões. Para ajudar na memória, as apresentações
de ensino eram repetidas, resumidas e ilustradas. Os escritores do
Evangelho retiveram essas ajudas de memória. As parábolas são uma
dessas técnicas. As parábolas são difíceis de definir: “Parábolas
são melhor definidas como estórias com dois níveis de significado;
o nível da estória fornece um espelho pelo qual a realidade é
percebida e compreendida”. Tirado do Dictionary of Jesus and the
Gospels [Dicionário de Jesus e dos Evangelhos], (pg. 594).
“Uma parábola é um provérbio ou estória que busca enfatizar
um ponto que o orador deseja enfatizar ilustrando a partir de uma
situação familiar da vida comum”. Tirado de The Zondervan
Pictorial Bible Encyclopedia [Enciclopédia Ilustrada da Bíblia de
Zodervan]” (pg. 590).
É difícil definir exatamente o que era compreendido pelo termo
“parábola” na época de Jesus
1. Alguns dizem que reflete o termo hebraico mashal que era qualquer
tipo de enigma (Marcos 3.23), ditados inteligentes (Provérbios,
Lucas 4.23), ditados curtos (Marcos 7.15) ou ditados misteriosos
(“ditados obscuros”).
2. Outros se agarram a uma definição mais limitada de uma estória
curta.
Dependendo de como alguém define o termo, mais de um terço dos
ensinos registrados de Jesus estão na forma de parábolas. Esse era
gênero literário importante do NT. Parábolas são, certamente,
ditados autênticos de Jesus. Se alguém aceita a segunda definição,
há ainda vários tipos diferentes de estórias curtas
1. estórias simples (Lucas 13.6-9)
2. estórias complexas (Lucas 15.11-32)
3. estórias contrastantes (Lucas 16.1-8; 18.1-8)
4. tipológicas/alegóricas (Mt 13.24-30, 47-50; Lucas 8.4-8, 11-15;
10.25-37; 14.16-24; 20.9-19; João 10; 15.1-8)
Ao lidar com essa variedade de material parabólico você deve
interpretar esses ditados em vários níveis. O primeiro nível seria
princípios hermenêuticos aplicáveis a todos os gêneros bíblicos.
Algumas diretrizes:
1. identificar o propósito do livro inteiro ou de pelo menos a
unidade literária maior
2. identificar o público original. É significativo que
freqüentemente a mesma parábola é dada para diferentes grupos,
exemplo:
a. a ovelha perdida em Lucas 15 dirigida a pecadores
b. a ovelha perdida em Mt 18 dirigida para os discípulos
3. não deixe de observar o contexto imediato da parábola.
Freqüentemente Jesus ou o escritor do evangelho diz o ponto
principal (geralmente no fim da parábola ou imediatamente depois
dela).
4. expresse a intenção(ões) central da parábola numa sentença
declarativa. Parábolas freqüentemente têm dois ou três
personagens principais. Geralmente há uma verdade, propósito ou
ponto (trama) implicado para cada personagem.
5. verifique as passagens paralelas nos outros Evangelhos, depois os
outros livros do NT e os livros do AT.
O segundo nível dos princípios interpretativos são aqueles que se
relacionam especificamente com o material parabólico
1. Leia (ouça se possível) a parábola diversas vezes. Essas foram
dadas para um impacro oral, não análise escrita.
2. A maioria das parábolas tem apenas uma verdade central que é
relacionada com os contextos históricos e literários tanto de Jesus
quanto do evangelista.
3. Tenha cuidado ao interpretar os detalhes. Freqüentemente eles são
apenas parte do cenário da estória.
4. Lembre que parábolas não são realidade. Elas são analogias
realistas, mas geralmente exageros, para enfatizar um ponto
(verdade).
5. Identifique os pontos principais da estória que um público
judaico do primeiro século teria compreendido. Então olhe para a
virada ou surpresa. Geralmente ela vem ao fim da estória (cf. A.
Berkeley Mickelsen no seu livro Interpreting the Bible [Interpretando
a Bíblia], pp. 221-224).
6. Todas as parábolas foram dadas para obter uma resposta. Essa
resposta é geralmente relacionada com o conceito de “O Reino de
Deus”. Foi Jesus foi iniciador do novo Reino Messiânico (Mt 21.31;
Lucas 17.21). Aqueles que O ouviram devem responder a Ele agora! O
Reino era também futuro (Mateus 25). O futuro de uma pessoa era
dependente de como ela respondesse a Jesus no momento. As parábolas
do Reino descreviam que o novo reino já tinha chegado em Jesus. Elas
descreviam suas exigências éticas e radicais para o discipulado.
Nada pode ser como era. Tudo é radicalmente novo e focado em Jesus!
7. Parábolas freqüentemente não expressam o ponto ou verdade
central. O intérprete deve buscar as chaves contextuais que revelam
as verdades originalmente culturalmente óbvias, mas agora obscuras
para nós.
Um terceiro nível que é freqüentemente controverso é aquele da
ocultação da verdade parabólica. Jesus freqüentemente falou da
ocultação das parábolas (cf. Mt 13.9-15; Marcos 4.9-13; Lucas
8.8-10; João 10.6; 16.25). Isso era relacionado com a profecia de
Is. 6.9, 10. O coração do ouvinte determina seu nível de
compreensão (cf. Mt 11.15; 13.9, 15, 16, 43; Marcos 4.9, 23, 33, 34;
7.16; 8.18; Lucas 8.8; 9.44; 14.35).
Contudo, deve também ser afirmado que freqüentemente a multidão
(Mt 15.10; Marcos 7.14) e os fariseus (Mt 21.45; Marcos 12.12; Lucas
20.19) compreendiam exatamente o que Jesus estava dizendo, mas
recusaram responder apropriadamente a isso pela fé e arrependimento.
Num sentido essa é a verdade da parábola do Semeador (Mt 13; Marcos
4; Lucas 8). As parábolas eram um meio de ocultar ou revelar a
verdade (Mt 13.16, 17; 16.12; 17.13; Lucas 8.10; 10.23, 24).
Grant Osborne, no seu Hermeneutical Spiral [A Espiral Hermenêutica],
p. 239, enfatiza o ponto que “parábolas são um ‘mecanismo de
encontro’ e funcionam diferentemente dependendo do público…Cada
grupo (líderes, multidões, discípulos) é encontrado
diferentemente pelas parábolas”. Freqüentemente até os
discípulos não compreendiam ou Suas parábolas ou Seus ensinos (cf.
Mt 15.16; Marcos 6.52; 8.17, 18, 21; 9.32; Lucas 9.45; 18.34; João
12.16).
Um quarto nível é também controverso. Esse lida com a verdade
central das parábolas. Os intérpretes mais modernos têm reagido
(justificadamente assim) às interpretações alegóricas das
parábolas. Alegoria tornou os detalhes em elaborados sistemas de
verdade. Esse método de interpretação não foca no cenário
histórico, cenário literário ou intenção autoral, mas
apresentava o pensamento do intérprete, não do texto.
Contudo, deve ser admitido que as parábolas que Jesus interpretou
são muito próximas do alegórico ou pelo menos tipológico. Jesus
usava os detalhes para transmitir a verdade (o Semeador, Mt 13;
Marcos 4; Lucas 8 e os arrendatários ímpios, Mateus 21; Marcos 12,
Lucas 20).
Algumas das outras parábolas também têm várias verdades
principais. Um bom exemplo é a parábola do Filho Pródigo (Lucas
15.11-32). Não é somente o amor do Pai e a obstinação do filho
mais novo, mas a atitude do filho mais velho que é integral o
significado completo da parábola.
Uma citação útil de Linguistics and Biblical Interpretation
[Lingüística e Interpretação Bíblica] de Peter Cotterell e Max
Turner: “Foi Adulf Julicher, mais do que nenhum outro que
dirigiu a erudição do Novo Testamento em direção a uma tentativa
decisiva de compreender o papel da parábola no ensino de Jesus. A
alegorização radical das parábolas foi abandonada e a busca
começou por uma chave que nos capacitaria a penetrar seu verdadeiro
significado. Mas como Jeremias tornou claro, ‘Seus esforços para
libertar as parábolas das interpretações fantásticas e
arbitrárias de cada detalhe fizeram-lhe cair num erro fatal’. O
erro foi insistir não meramente que uma parábola deveria ser
compreendida como transmitindo uma única idéia, mas que a idéia
deveria ser tão geral quanto possível” (p. 308).
Outra citação útil de The Hermeneutical Spiral [A Espiral
Hermenêutica] de Grant Osborne: “Contudo eu tenho notado muitas
indicações de que as parábolas são de fato alegorias, embora
controladas pela intenção do autor. Bloomberg (1990) de fato
argumenta que há tantos pontos quanto há personagens nas parábolas
e que elas são de fato alegorias. Enquanto isto seja de algum modo
exagerado, está mais próximo da verdade do que a abordagem de ‘um
ponto’” (p. 240).
As parábolas deveriam ser usadas para ensinar verdades doutrinárias
ou para iluminar verdades doutrinárias? A maioria dos intérpretes
tem sido influenciada pelo abuso do método alegórico de interpretar
parábolas que as permitiu ser usadas para estabelecer doutrinas que
não têm conexão com a intenção original de Jesus nem com aquela
do escritor do evangelho. O significado deve estar vinculado com a
intenção autoral. Jesus e os escritores do evangelho estavam sob
inspiração, mas os intérpretes não estão.
Contudo gravemente as parábolas têm sido abusadas que elas ainda
funcionam como veículos de ensino da verdade, verdade doutrinária.
Ouça Bernard Ramm neste ponto: “Parábolas realmente ensinam
doutrinas e afirmação de que elas não podem ser usadas de forma
alguma em escrito doutrinário é imprópria…nós devemos verificar
nossos resultados com o ensino simples, evidente do nosso Senhor, e
com o restante do Novo Testamento. Parábolas com os cuidados
adequados podem ser usadas para ilustrar doutrina, iluminar a
experiência cristã e para ensinar lições práticas”. Protestant
Biblical Interpretation [Interpretação Bíblica Protestante] (p.
285).
Em conclusão deixe-me dar-lhes três citações que refletem
advertências na nossa interpretação de parábolas:
1. Tirada de Entendes o Que Lês? de Gordon Fee e Doug Stuart: “…as
parábolas têm sofrido uma triste sorte de interpretações errôneas
na igreja, superada somente pelo Apocalipse” (p. 121)
2. Tirada de Understanding and Applying the Bible [Compreendendo e
Aplicando a Bíblia] de J. Robertson McQuilkin: “Parábolas têm
sido a fonte de bênçãos incontáveis na iluminação do povo de
Deus no que se refere a verdade espiritual. Ao mesmo tempo, parábolas
têm sido a fonte de confusão incontável tanto na doutrina quanto
na prática na igreja” (p. 164).
3. Tirada de The Hermeneutical Spiral [A Espiral Hermenêutica] de
Grant Osborne, “Parábolas tem estado entre as mais escritas,
contudo hermeneuticamente abusadas porções da Escritura…o mais
dinâmico contudo o mais difícil de compreender dos gêneros
bíblicos. O potencial da parábola para comunicação é enorme,
visto que ela cria uma comparação ou estória baseada nas
experiências do dia a dia. No entanto, essa estória mesma é capaz
de muitos significados, e o leitor moderno tem tanta dificuldade de
interpretá-la quanto tiveram os antigos ouvintes” (p. 235).
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